Descoberta surpreendente no intestino revela um gatilho oculto para diabetes e doenças do fígado

Uma equipe de cientistas canadenses descobriu uma nova e surpreendente forma de melhorar os níveis de açúcar no sangue e reduzir danos ao fígado: ao capturar um combustível pouco conhecido produzido por bactérias intestinais antes que eles causem estragos no corpo.
As descobertas, publicadas na Cell Metabolism em 29 de julho de 2025, podem abrir portas para novas terapias para tratar doenças metabólicas como diabetes tipo 2 e doença hepática gordurosa.
Pesquisadores da Universidade McMaster, da Université Laval e da Universidade de Ottawa mostraram que uma molécula produzida por micróbios no intestino pode se infiltrar na corrente sanguínea e estimular o fígado a produzir mais glicose e gordura do que o necessário. Contudo, quando os pesquisadores desenvolveram uma forma de capturar essa molécula no intestino antes que entrasse no corpo, observaram melhorias dramáticas no controle do açúcar no sangue e na doença hepática gordurosa em camundongos com obesidade.
“Esta é uma nova abordagem em uma via metabólica clássica”, diz Jonathan Schertzer, autor sênior e correspondente e professor do Departamento de Bioquímica e Ciências Biomédicas da McMaster. “Sabemos há quase um século que músculos e fígado trocam lactato e glicose – um processo chamado ciclo de Cori. O que descobrimos é um novo ramo desse ciclo, onde as bactérias intestinais também fazem parte da conversa.”
Em 1947, os cientistas casados Carl Ferdinand Cori e Gerty Theresa Cori foram premiados com o Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina por seu trabalho que demonstrou como os músculos do corpo geram lactato que alimenta o fígado para produzir glicose no sangue, que então circula de volta para alimentar os músculos. Essa pesquisa lançou as bases para explicar como os músculos utilizam uma forma de lactato (L-lactato) e como o fígado utiliza glicose no sangue para se comunicarem e trocarem combustível.
A equipe canadense descobriu que camundongos obesos – e até mesmo pessoas com obesidade – apresentam níveis mais altos de uma molécula menos conhecida, o D-lactato, no sangue. Ao contrário do L-lactato, mais familiar e produzido pelos músculos, a maior parte do D-lactato é originada de microrganismos intestinais e demonstrou aumentar os níveis de açúcar no sangue e a gordura do fígado de forma mais agressiva.
Para impedir isso, os pesquisadores criaram um “gatilho de substrato intestinal” – um polímero biodegradável e seguro que se liga ao D-lactato no intestino e impede sua absorção. Os camundongos que receberam esse gatilho apresentaram níveis de glicose mais baixos no sangue, menos resistência à insulina e redução da inflamação e fibrose hepáticas – tudo isso sem alterar a dieta ou o peso corporal.
“Esta é uma maneira completamente nova de pensar sobre o tratamento de doenças metabólicas como diabetes tipo 2 e doença hepática gordurosa. Em vez de direcionar hormônios ou o fígado diretamente, estamos interceptando uma fonte de combustível microbiano antes que ela possa causar danos”, afirma Schertzer, membro do Centro de Pesquisa em Metabolismo, Obesidade e Diabetes (MODR) e do Instituto de Pesquisa em Saúde Digestiva da Família Farncombe da McMaster. Schertzer é titular de uma Cátedra de Pesquisa do Canadá em Inflamação Metabólica.
A pesquisa, financiada pelos Institutos Canadenses de Pesquisa em Saúde (CIHR), destaca a crescente importância do microbioma em doenças crônicas.