Ana troca o ferro de engomar por um fogão: agora faz torricado de bacalhau no mercado
Quando tinha apenas 13 anos, uma tragédia familiar forçou Ana a amadurecer mais cedo do que o esperado. “Minha mãe faleceu, e eu fiquei em casa com meu pai e cinco irmãos. No total, eram sete bocas para alimentar”, recorda em entrevista à New in Amadora. O pai estava ocupado com sua vida, e os irmãos eram mais novos, então ficou a cargo de Ana fazer o necessário.
Entretanto, sua primeira experiência na cozinha foi um fiasco, como ela mesma admite, entre risadas. “Na minha estreia, tentei preparar arroz de tomate com peixe frito. O peixe não recebeu farinha e o arroz grudou todo no tacho. Imaginem, foi algo promissor. Tudo para o lixo”, descreve Ana, que hoje tem 54 anos.
A necessidade acabou por aguçar sua criatividade, e quase 40 anos depois, aquele prato difícil de se preparar agora “sai maravilhosamente bem”, conta Tia Ana, o título que recebeu por sugestão da filha mais nova e das sobrinhas.
No ano de 2022, Ana Melo foi convidada a participar das festividades dos Santos Populares, no Campo Pequeno, em Lisboa. “Começamos a discutir o nome da minha banca, e minha filha sugeriu Tia Ana. As amigas dela acharam ótimo, já que todas me chamavam de tia, e assim ficou.”
Com isso, Ana recebeu convites para outras festas populares, onde aproveitou para aumentar sua renda. Sua vida, até então, não era essa, mas todos perguntavam onde ficava seu restaurante, dada a fama de sua comida nas feiras. “Restaurante eu não tenho, mas se alguém quiser passar a ferro, terei o maior prazer”, respondia, pois Ana tinha uma engomadoria.
Contudo, os elogios que recebeu e os convites para as festas — sendo que na semana passada esteve em Terrugem, em Sintra, onde em quatro dias ganhou “muito mais do que em um restaurante” — fizeram-na considerar uma mudança de ramo.
“Conversei com a D. Manuela, responsável pelo mercado da Mina, e com o Tiago, encarregado da cultura, sobre a possibilidade de ocupar um espaço vago.” A conversa fluiu bem e Tia Ana abriu suas portas no dia 25 de abril deste ano, em um pequeno local que se conecta tanto ao exterior do mercado quanto à área de compras.
“Está indo muito bem e estou muito feliz”, afirma, sorrindo. “Sempre tenho um prato do dia; além da sopa, preparo torricado de bacalhau (5€), hambúrgueres (a partir de 4,5€), cachorros e bifanas”, detalha.
De vez em quando, o espaço fecha por dois ou três dias em razão do negócio. “Continuo participando de muitas festas populares e costumo ganhar mais. Portanto, nesses dias, a loja fica fechada. Mas as pessoas já me conhecem e sabem que se a porta estiver fechada, é porque estou em alguma feira. É preciso aproveitar cada centavo que aparece”, enfatiza.
“Faço também sopa da pedra (3€) e carne às Mercês (5€), que fazem muito sucesso com meus clientes. Porém, os pratos mais populares são o bacalhau à Brás (5€), a açorda de camarão (5€), o frango com espaguete (5€) e o arroz de polvo (5€). É tudo caseiro. O espaço é pequeno, mas tenho as condições necessárias”, explica à NiA.
Ana Melo não é natural da Amadora, mas o amor fez com que se estabelecesse. “Sou de Lisboa e morei em Caneças durante muitos anos. Mudei-me para a Amadora quando conheci meu marido e fomos morar nos Moinhos da Funcheira.” O começo foi um pouco complicado, admite, mas hoje não trocaria o concelho por nada. “Estamos juntos há 20 anos e casamos em 2010.”
Com o sucesso de Tia Ana no mercado da Mina, a cozinheira ficaria feliz em contribuir para a revitalização de outros locais semelhantes no concelho. “Adoraria ter outro espaço. Gosto do ambiente de mercado e da interação com as pessoas”, conta, embora reconheça que sozinha é difícil.
“Meu marido tem sua própria ocupação, nada a ver com restauração.” A filha mais nova, de 25 anos, ajuda nas feiras, mas não no mercado. A filha mais velha emigrou para a Hungria e já lhe deu duas netas, uma de dez e outra de dois anos. “Morro de saudades, mas isso nem precisa ser dito.”
Clique na galeria e veja algumas imagens da Tia Ana em ação.
