Saúde

Bactérias cavalo de Tróia levam vírus anticâncer para dentro dos tumores

Bactérias cavalo de Tróia levam vírus anticâncer para dentro dos tumores

Pesquisadores da Columbia Engineering desenvolveram uma terapia contra o câncer que faz com que bactérias e vírus trabalhem em conjunto. Em um estudo publicado recentemente na Nature Biomedical Engineering, o Laboratório de Sistemas Biológicos Sintéticos mostra como seu sistema oculta um vírus dentro de uma bactéria que busca tumores, o que permite que ele passe despercebido pelo sistema imunológico e seja liberado dentro de tumores cancerígenos.

A nova plataforma combina a tendência das bactérias de encontrar e atacar tumores com a preferência natural do vírus por infectar e destruir células cancerosas. Tal Danino, professor associado de engenharia biomédica na Columbia Engineering, liderou o esforço da equipe para criar o sistema, chamado CAPPSID (sigla para Atividade Coordenada de Procariontes e Picornavírus para Entrega Intracelular Segura). Charles M. Rice, um especialista em virologia na Universidade Rockefeller, colaborou com a equipe da Columbia.

“Nosso objetivo era aprimorar a terapia bacteriana contra o câncer, permitindo que as bactérias entregassem e ativassem um vírus terapêutico diretamente dentro das células tumorais, enquanto projetávamos salvaguardas para limitar a propagação viral fora do tumor”, diz Jonathan Pabón, coautor principal e candidato a MD/PhD na Columbia.

Os pesquisadores acreditam que essa tecnologia — validada em camundongos — representa o primeiro exemplo de cooperação engenheirada diretamente entre bactérias e vírus direcionados ao câncer.

A abordagem combina o instinto das bactérias de se direcionar a tumores com a habilidade do vírus de infectar e eliminar células cancerosas. “Ao unir engenharia bacteriana com virologia sintética, nosso objetivo é abrir um caminho para terapias multi-organismos que podem alcançar muito mais do que qualquer microbe isolado poderia sozinho”, diz Zakary S. Singer, coautor principal e ex-pós-doutorado no laboratório de Tal Danino.

“Esta é provavelmente nossa plataforma mais técnica e inovadora até agora”, diz Danino, que também está afiliado ao Herbert Irving Comprehensive Cancer Center no Columbia University Irving Medical Center e ao Data Science Institute da Columbia.

Passando despercebido pelo sistema imunológico

Um dos maiores obstáculos na terapia de oncolíticos é o próprio sistema de defesa do corpo. Se um paciente tem anticorpos contra o vírus — devido a uma infecção anterior ou vacinação — esses anticorpos podem neutralizá-lo antes que ele alcance um tumor. A equipe da Columbia contornou esse problema escondendo o vírus dentro de bactérias que buscam tumores.

“As bactérias agem como uma capa de invisibilidade, escondendo o vírus de anticorpos circulantes e transportando-o para onde é necessário”, diz Singer.

Pabón afirma que essa estratégia é especialmente importante para vírus aos quais as pessoas já foram expostas na vida cotidiana.

“Nosso sistema demonstra que bactérias podem potencialmente ser usadas para lançar um vírus oncolítico para tratar tumores sólidos em pacientes que desenvolveram imunidade a esses vírus”, acrescenta.

Direcionando o tumor

A parte bacteriana do sistema é Salmonella typhimurium, uma espécie que naturalmente migra para o ambiente rico em nutrientes e pobre em oxigênio dentro dos tumores. Uma vez lá, as bactérias invadem células cancerosas e liberam o vírus diretamente no interior do tumor.

“Programamos as bactérias para atuarem como um cavalo de Tróia, transportando o RNA viral para os tumores e, em seguida, se rompendo diretamente dentro das células cancerosas para liberar o genoma viral, que poderia, então, se espalhar entre as células cancerosas”, diz Singer.

Aproveitando os instintos das bactérias de se direcionar a tumores e a capacidade do vírus de se replicar dentro das células cancerosas, os pesquisadores criaram um sistema de entrega que pode penetrar no tumor e se espalhar por ele — um desafio que limitou tanto as abordagens somente bacterianas quanto as virais.

Segurança contra infecções descontroladas

Uma preocupação fundamental com qualquer terapia de vírus vivos é controlar sua propagação para além do tumor. O sistema da equipe resolveu esse problema com um truque molecular: garantindo que o vírus não pudesse se espalhar sem uma molécula que ele só pode obter das bactérias. Como as bactérias permanecem no tumor, esse componente vital (chamado de protease) não está disponível em nenhum outro lugar do corpo.

“Partículas virais espalháveis só poderiam se formar nas proximidades das bactérias, que são necessárias para fornecer a maquinaria especial essencial para a maturação viral no vírus engenheirado, criando uma dependência sintética entre os microrganismos”, diz Singer. Essa salvaguarda adiciona uma segunda camada de controle: mesmo que o vírus escape do tumor, não se espalhará nos tecidos saudáveis.

“São sistemas como esses — especificamente voltados para aumentar a segurança dessas terapias vivas — que serão essenciais para traduzir esses avanços para a clínica”, afirma Singer.

Pesquisa adicional e aplicações clínicas

Esta publicação marca um passo significativo na direção de tornar este tipo de sistema bactéria-vírus disponível para futuras aplicações clínicas.

“Como médico-cientista, meu objetivo é levar medicamentos vivos para a clínica”, diz Pabón. “Esforços para a tradução clínica estão atualmente em andamento para trazer nossa tecnologia para fora do laboratório.”

Danino, Rice, Singer e Pabón apresentaram um pedido de patente (WO2024254419A2) ao Escritório de Patentes e Marcas dos EUA relacionado a este trabalho.

Olhando para o futuro, a equipe está testando a abordagem em uma gama mais ampla de tipos de câncer, usando diferentes tipos de tumores, modelos de camundongos, vírus e cargas virais, com o objetivo de desenvolver um “kit de ferramentas” de terapias virais que podem perceber e responder a condições específicas dentro de uma célula. Eles também estão avaliando como esse sistema pode ser combinado com cepas de bactérias que já demonstraram segurança em ensaios clínicos.

Pat Pereira

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