22 Nacionalidades em Harmonia na Escola da Amadora
Na Quinta da Bolacha, em Falagueira-Venda Nova, a escola Secundária Mães de Águas apresenta-se como típica das instituições educativas dos anos 80 em Portugal. Possui pátios e telheiros para proteção da chuva, pavilhões com salas de aula interligadas por uma escadaria central, um refeitório animado e muitos jovens espalhados pelo espaço, sentados e entretidos com os seus telemóveis.
A primeira impressão se confirma: a Mães de Água foi inaugurada em 13 de janeiro de 1984, como uma secção da Escola Secundária da Brandoa, contando inicialmente com 30 turmas do sétimo ano, totalizando 812 alunos, 53 professores, quatro funcionários administrativos e oito auxiliares de ação educativa.
No dia 1 de outubro de 1985, a escola conquistou autonomia, conforme a Portaria Nº 465/85 de 17/07/85, e elegeu o primeiro Conselho Diretivo no ano letivo de 1987/88.
A oferta letiva expandiu-se até ao 11.º ano (o ensino secundário começou no ano anterior, com cinco turmas do 10.º ano), contando com um total de 1753 alunos. Apesar disso, permaneceu predominantemente como uma escola de ensino unificado, e mesmo a introdução do 12.º ano (com quatro turmas) no ano letivo de 1992/93 não alterou essa realidade, que se mantém até hoje.
O recreio é quase sempre sinónimo de receio
/p>A coordenadora da escola, Idália Augusto, aguardava a equipe da New in Amadora, que chegou 30 minutos atrasada, e acabou pegando o intervalo de uma escola com 700 alunos. O recreio em uma escola desse porte é igual em qualquer lugar: correria, gritos, pedidos no bar, funcionárias pedindo silêncio e brincadeiras intermináveis.
Idália, surpresa, acreditava que o nosso interesse era em ver um ambiente sereno no final da primeira semana de aulas. Na verdade, desejávamos testemunhar essa energia vibrante e animada de uma escola onde convivem 22 nacionalidades, tornando-a a mais diversa da Amadora, um concelho com mais de 110 nacionalidades.
“Gerir alunos de 22 nacionalidades apresenta um grande desafio. Temos culturas, religiões e idiomas diferentes. Recebemos alunos que não entendem uma palavra de português”, explica a diretora, acompanhada de Ana Margarida Múrias, professora de Físico-Química e diretora de turma.
“Alguns alunos nem dominam o inglês, o que complica a comunicação. Por vezes, utilizamos o Google Translate. Temos uma sala que chamamos de A Zero para estudantes que não dominam o português, e frequentemente nos comunicamos com tradutores.”
A absorção cultural dos alunos é, segundo Ana Margarida, bastante positiva. “O preconceito muitas vezes é uma construção dos adultos. Os conflitos surgem, por vezes, entre alunos do Paquistão e da Índia, devido a choques culturais. Buscamos mostrar que aqui somos todos iguais, não aceitamos provocações, muito menos em uma escola.”
O projeto educativo da Mães de Água “é semelhante ao de qualquer outra escola: fundamentado em inclusão e acolhimento. Todos os alunos são iguais.”
Veio da Índia e quer ser médica
Yash, uma indiana de 17 anos, vive em Portugal há dez. “Já sou quase portuguesa”, diz, rindo, com perfeição no seu português, apesar de ser do Norte da Índia. “Esta foi a primeira escola que frequentei quando cheguei ao país e continua a ser a única.”
Atualmente, no 11.º ano, é uma aluna exemplar, com média de 18,7, o que alimenta seu sonho de estudar Medicina. “Ainda não sei a especialidade, mas quero ser médica”, revela à New in Amadora.
Yash se sente completamente integrada. “Gosto muito de estar aqui. Para qualquer imigrante, estudar nesta escola é um privilégio, pois muitas pessoas compartilham a mesma experiência que eu.”
No início, no entanto, não foi fácil. “Não conhecia nada nem ninguém, e a adaptação foi muito difícil. No começo, senti-me excluída. É normal, em um país, com uma cultura tão diferente. Agora, isso não acontece mais. Todos nos damos bem e nunca senti discriminação. Talvez isso se deva à minha aparência mais ocidental.”
Contudo, Yash relembra um caso de discriminação. “Era uma menina que usava hijab e vi colegas tentando puxar-lhe o lenço. Tentei ajudar e falei com os professores, que tomaram providências.”
A experiência dela é um caso isolado. “Estou totalmente adaptada. Conheço quase todos os professores e funcionários, sinto-me quase em família. E ajudo outros imigrantes, pois sei exatamente como se sentem, já passei por essa fase.”
A relação de Yash com a cultura portuguesa está plenamente integrada. “Amo comida indiana, minha favorita, mas também adoro a comida portuguesa. Bifanas, francesinhas e caldo verde são meus pratos preferidos.”
O começo difícil de Holya
Holya, de 16 anos, natural da Tunísia, também frequenta o 11.º ano na mesma escola multicultural. Apesar de hoje estar feliz, contou que o início foi “muito difícil”.
“Era tímida, não tinha amigos, não sabia como interagir e me sentia sozinha. O primeiro mês foi muito complicado, especialmente por não falar português. Eu ficava isolada.”
Com o tempo, começou a usar o telemóvel para traduzir, o que agradou aos colegas e facilitou a comunicação. “Assim, comecei a falar com eles em inglês e aprendi algumas palavras em português.”
Está na escola há três anos e “gosta muito da experiência”. “Adoro a escola, pois tenho colegas da minha idade da Índia, Paquistão, Guiné-Bissau e Cabo Verde. Isso é maravilhoso, estamos em contato com muitas culturas diferentes.”
Holya não possui uma média tão alta como Yash. “Tenho média de 11 e esforço-me muito”, diz. A amiga reafirma: “É uma ótima nota, dado que ela está se esforçando muito. A área de Ciências e Tecnologia é desafiadora e ela não falava português, mas está indo muito bem.”
Virado para o mundo
Cinco dos seis alunos entrevistados pela New in Amadora tinham autorização dos pais para falar com a imprensa e serem fotografados. “Trouxeram as autorizações ontem”, informa Ana Margarida Múrias. Contudo, dois alunos preferiram se manter de costas para a foto por timidez ou convicções religiosas, não por rebeldia.
Esse é o caso de Zaid, que vem do Paquistão e tem 14 anos, atualmente no 8.º ano. “Estou há seis anos em Portugal, cinco aqui na escola”, confidencia.
“Gosto muito de estudar aqui, pois as aulas são boas e os professores são atenciosos. Eles sempre se preocupam se estamos compreendendo o conteúdo”, destaca.
A integração de Zaid foi facilitada. “Tenho muitos amigos de culturas diferentes, o que enriquece a experiência. Conheço uma dezena de colegas aqui. Faço amigos mais facilmente agora, mas sou um pouco tímido.”
Quando perguntado sobre sua comida favorita, o jovem não hesita: “Sim, hambúrguer!” causando risadas.
“Ele é um ótimo aluno, nota 5,” diz a diretora de turma. Zaid aspira a cursar universidades na área de Programação e Engenharia, com o objetivo de trabalhar com seu pai.
Barra em Matemática
Syed, também de 14 anos e paquistanês, quase provoca um incidente diplomático ao responder sobre sua escola. Ele afirma gostar, mas ao ser questionado sobre sua matéria favorita, não hesita: “Matemática.” “O quê? Não é Físico-Química?” pergunta a professora, fazendo-se de zangada.
Syed se descreve “completamente integrado” na escola, que frequenta há dois anos, desde que chegou a Portugal. “A adaptação tem sido boa. O maior desafio foi a barreira do idioma, mas temos colegas com experiências semelhantes e nos ajudamos.”
Ele deseja seguir para a universidade em Tecnologias da Informação e elege seu prato favorito: “cheeseburger”, um toque de humor ao seu discurso.
A mais nova tem ar de boss
O aluno mais novo é Prisma, de 12 anos, do Nepal. Apesar da idade, parece mais madura em sua atitude.
“Estou aqui há um ano e já me sinto integrada. Fiz amigos, o que ajudou na adaptação, porque não me sinto sozinha.”
Prisma gosta de Artes e aspira a ser “artista e cientista”, revelando isso com determinação. “Sei que pode ser difícil conciliar, mas é meu objetivo. Vim morar com meu tio. Os professores são bons e sempre se preocupam conosco. Nunca senti discriminação.”
Ela afirma que adora comida portuguesa, mas acha que é “muito suave”. “Sinto falta de comidas mais picantes”, brinca.
Prisma faz a foto para a New in Amadora em sala de aula. Com estilo, cruza os braços em um gesto de confiança. “Está bem assim?”. “Perfeito. Pareces uma boss,” respondemos, fazendo-a rir.
“É preciso controlar as fronteiras”
Após uma hora na Escola Mães de Água, a algazarra do intervalo deu lugar ao silêncio e à disciplina. A maioria das salas está ocupada com professores e alunos — portas abertas e alunos concentrados. “Repare que aqui é tranquilidade. Eles são muito disciplinados”, observa a professora de Físico-Química.
Chegou o momento de ouvir o único aluno português escolhido aleatoriamente para esta reportagem. Sérgio Fernandes, 18 anos, está sentado ao lado da janela, vestido com uma camiseta branca. “Tem certeza que me querem aqui?” pergunta, rindo. Nós afirmamos, sem conhecer seu histórico.
Ele revela que é português, estuda na escola há quatro anos e sonha com uma carreira militar. “Quero seguir a vida militar, é um desejo antigo”, conta à New in Amadora. E como é estudar em uma escola com alunos de 23 nacionalidades? “No começo foi estranho, mas agora procuro ajudar na integração.”
“Na maioria das vezes, são pessoas boas, que vêm em busca de estudar, mas que não falam português, e precisamos auxiliar. A escola tem feito um ótimo trabalho de acolhimento.”
Porém, Sérgio também compartilha uma experiência de preconceito. “Quando cheguei aqui, era um menino da aldeia e a cidade parecia muito grande. Fiquei surpreso, nunca tinha visto pessoas diversas. Foi um choque, mas depois fui me adaptando. Tenho meus próprios conceitos, mas trato a todos bem e ajudo meus colegas estrangeiros”, conclui.
Explore a galeria e conheça esta escola multicultural e enriquecedora e os alunos que escolheram a Amadora como seu lar para estudar em Portugal.